Há uma discussão boa sobre propósito de vida.
Ela basicamente divide dois tipos de pessoas: as que acreditam que você nasce com um propósito e as que não acreditam nisso.
Ou seja, as que acreditam em descobrir seu propósito já existente, e as que acreditam em criar um ao longo do caminho.
O que você acha?
Eu já pensei, li e discuti sobre esse assunto. Mas a minha opinião fará mais sentido depois de percorrer o seguinte caminho:
- Introdução
- O que é propósito de vida?
- A importância de ter um propósito
- Começando a responder: Determinismo ou Livre Escolha
- Você está preso a um destino pessoal específico
- Podemos ser tudo o que quisermos
- A minha opinião
- Propósito de vida: descobrir ou criar?
- O poder do autoconhecimento
- Conclusão
Vamos lá?
INTRODUÇÃO
“Todos os homens, por natureza, desejam saber”
Aristóteles
O tema propósito ficou bastante popular nos últimos tempos.
Só nos últimos 3 anos, o Google Trends revela um bom crescimento nas buscas do termo “propósito de vida”.
Ou seja, se as pessoas estão buscando mais é porque estão mais interessadas no assunto.
Bom sinal, afinal o tempo em que o nosso papel como espécie humana era apenas sobreviver acabou faz tempo.
Daniel Pink, em seu livro Drive, divide a motivação humana em 3 fases:
- MOTIVAÇÃO 1.0: Sobrevivência
- Quem se preocupa com o significado da vida quando sua tribo pode ser atacada durante a noite? Em determinada época, o que motivava o ser humano era permanecer vivo.
- MOTIVAÇÃO 2.0: Recompensas e punições externas
- Algo que funcionou bem no século 20 com modelos de trabalho mais lineares e padronizados. O que o ser humano queria nessa época, principalmente no período pós-guerra, era estabilidade, isso implicava em fazer o que tinha que ser feito e não em trabalhar com propósito.
- MOTIVAÇÃO 3.0: Autonomia, domínio e propósito
- Por fim, em tempos mais estáveis e abundantes, percebemos que a verdadeira motivação não vem de fora, mas de dentro. Segundo Pink, ter autonomia, domínio e propósito é o que nos motiva hoje em dia.
Enfim, grandes nomes falam sobre propósito: Mario Sergio Cortella, Simon Sinek, Martin Seligman, Daniel Pink, Paulo Coelho, Stephen Covey, Clayton Christensen e outros.
E sinceramente, esses são apenas bebês do assunto, pois o tema começou a ser discutido na Grécia antiga há aproximadamente 2.500 anos.
Mas e então, o que é esse tal de propósito?
O QUE É PROPÓSITO DE VIDA?
É simples, é basicamente o seu papel no mundo.
Talvez você conheça por outros nomes: missão de vida, seu porquê, sua razão de existir, seu chamado, lenda pessoal, verdadeiro norte, e estrela-guia.
O propósito da sua vida é o significado da sua vida.
Sim, é forte mesmo. Por isso, falar de propósito muitas vezes é falar de espiritualidade. Veja só:
“O seu propósito nada mais é do que o serviço que você veio prestar à humanidade” (Sri Prem Baba)
“Nós somos seres espirituais que assumimos forma física para cumprir um propósito. Todo mundo tem um propósito na vida – um dom único ou talento especial para dar aos outros” (Deepak Chopra)
Não se preocupe com a grandiosidade do conceito, não quer dizer que precisamos ser o próximo Martin Luther King.
Como veremos em breve, um propósito pode ter várias formas e jeitos. Enquanto uns realmente ouvem um “chamado”, outros enxergam a questão de maneira mais prática.
Isto é, seu propósito pode ser desde levar pequenas doses de alegria e empatia para seus vizinhos, até lutar pela igualdade social nos palanques globais.
A IMPORTÂNCIA DE TER UM PROPÓSITO
“Uma vida com propósito é aquela em que eu entenda as razões pelas quais faço o que faço e pelas quais claramente deixo de fazer o que não faço”
Mario Sergio Cortella
Saber seu propósito é um grande diferencial, pois, no fim das contas, é saber por que você faz o que faz todos os dias.
De repente, você tem mais clareza sobre tudo.
Você sabe por que acordou. Numa livraria, você sabe o que comprar. Se precisar escrever o mini resumo do seu perfil do facebook, você logo sabe o que dizer. Se está procurando trabalho, você sabe qual o seu tipo de empresa.
Ou seja, quem tem clareza do seu porquê, toma todas as pequenas e grandes decisões da vida com muito mais facilidade.
No fim, é como se você tivesse uma vantagem competitiva em relação ao restante das pessoas.
Mostrar lados extremos ajuda a entender. Qual, então, é o oposto dessa clareza total?
É estar no escuro, perdido. É estar no meio do mar sem saber usar as velas do seu barco. Quando bate o vento para a esquerda, você vai. Quando bate o vento para a direita, você vai também.
Na vida, seria alguém que ri de todas as piadas, que bebe quando todo mundo bebe, que acaba em empresas que não gosta, e que escolhe os relacionamentos errados sem saber por quê.
Vou dizer a verdade para você, é MUITO mais difícil chegar em terra firme quando a gente não sabe usar as velas do nosso barco.
Mas e então, esse propósito da nossa vida é algo que recebemos de fábrica e precisamos descobrir, ou é algo que nunca tivemos e precisamos criar do zero?
Bom, o início da resposta está na diferença entre Determinismo e Livre Escolha.
COMEÇANDO A RESPONDER: DETERMINISMO OU LIVRE ESCOLHA
Esses 2 tipos de pensamentos filosóficos estão na essência da nossa questão sobre propósito.
De um lado, o Determinismo acredita que forças maiores controlam nosso destino: sua classe social, condições políticas, geografia, e sua genética só para citar alguns exemplos.
Já a Livre Escolha acredita que somos livres para moldar nossas vidas e criar nosso destino, independentemente de qualquer condição externa.
Para o nosso interesse aqui hoje, o determinismo acredita que nascemos com um propósito e a livre escolha acredita que criamos o nosso propósito.
Enfim, estamos presos ou livres?
A) VOCÊ ESTÁ PRESO A UM DESTINO PESSOAL ESPECÍFICO
Steven Pressfield é autor do profundo livro The War of Art (A Guerra da Arte, em tradução livre). Em um parágrafo muito forte, ele revela sua visão determinista:
“Você tem filhos? Então você sabe que cada um veio ao mundo com uma personalidade distinta e única. Cada criança é quem ela é. Mesmo gêmeos idênticos, constituídos pelo mesmo material genético, são radicalmente diferentes desde o primeiro dia e sempre serão. Em outras palavras, nenhum de nós nasce como um material genérico e passivo esperando que o mundo carimbe sua marca em nós. Em vez disso, nós já chegamos tendo uma alma individual e altamente refinada”.
Aumentando o tom, ele continua assim:
“Outra maneira de pensar é assim: nós não nascemos com escolhas ilimitadas. Nós não podemos ser o que quisermos ser. A gente vem ao mundo com um destino pessoal específico. Nós temos um trabalho a fazer, um chamado para atender, um “eu” para ser. Somos o que somos desde o berço e estamos presos à isso. Nossa função nessa vida não é nos moldar segundo um ideal que imaginamos ser, mas encontrar quem nós já somos e ser isso”.
Forte, né?
Os argumentos não poderiam ser mais claros:
- Estamos presos
- Destino pessoal específico
- Nossa função nessa vida não é nos moldar
Para Pressfield, esse escritor que influenciou milhões de pessoas, propósito é sobre descobrir e depois agir. Sobre enxergar sua missão para executá-la. Para ele foi assim que aconteceu.
Mas não é bem assim que pensam as figuras abaixo.
B) VOCÊ PODE SER O QUE QUISER
Do lado totalmente oposto, existe a ideia que você pode moldar 100% do seu destino.
Em outras palavras, dinheiro, carreira, relacionamentos e qualquer outra área da sua vida pode ser moldada pelo exercício do querer e está totalmente dentro do seu controle.
Num artigo do Medium que li esses dias, o autor confessa que ouviu repetidamente os adultos da sua vida dizerem que ele poderia ser qualquer coisa que ele quisesse.
Realmente é bastante comum ouvir isso em algum momento da vida.
Numa palestra, Abílio Diniz disse assim: “Nada acontece na vida por acaso. Nós determinamos aquilo que nós queremos ser”.
A ideia de que podemos tudo é inspiradora, ainda mais sabendo da trajetória desse grande homem.
Murilo Gun, um cara que eu admiro profundamente, disse num vídeo: “Nessa organização [chamada] vida, você têm autonomia para escolher qual é o papel que você quer exercer dentro da humanidade”.
Ou seja, ele também acredita que propósito é questão de criar.
Tudo na mesa, mas antes de concluir esse artigo, eu gostaria de compartilhar o raciocínio abaixo.
A MINHA OPINIÃO: NÓS PODEMOS SER ALGUMAS COISAS
Eu acredito que nós NÃO podemos ser qualquer coisa.
Mas isso não significa que precisamos ser uma coisa só.
Ou seja, eu acredito que nós podemos ser algumas coisas.
Por que?
Se é possível notar claramente a personalidade, os talentos, e os interesses de uma criança ainda pequena, é porque nós nascemos com uma bagagem própria de fábrica. Afinal, nessa altura o mundo ainda não teve tempo de nos influenciar, logo essa é a nossa bagagem pura e autêntica.
Sendo assim, o nosso papel no mundo está relacionado a essa bagagem. Nossa grande missão está relacionada a essa bagagem. E nosso trabalho será descobrí-la para então executá-la.
Ou seja, eu concordo com o determinismo (propósito se descobre).
Mas tem um porém, dentro dessa bagagem há muitas habilidades, interesses e talentos, logo há muitos caminhos a seguir. Isto é, nossa bagagem é a nossa direção, mas não o destino exato. O destino exato está nas nossas mãos.
Ou seja, eu concordo com a livre escolha (propósito se cria).
Por exemplo, vamos supor que na sua bagagem tenha: intuição, criatividade, humildade, e sensibilidade artística, ok? Com isso em mãos, você pode contribuir para mundo de várias maneiras. Talvez como designer, talvez como escritor de ficção, talvez como consultor de criatividade para grandes empresas, ou talvez até as 3 coisas.
No entanto, se você optar por trabalhar numa mesa de operações do mercado financeiro ou como chefe de produção de uma fábrica de componentes automotivos, você não usará plenamente a sua bagagem.
Nesse caso, você poderá ter saído da sua área de grande contribuição, do seu verdadeiro norte na vida. Afinal, como você usaria sua intuição num ambiente que demanda razão? Como dar vazão a sua sensibilidade artística dentro de uma fábrica quadrada? Nesse lugar aí, qual será seu diferencial?
PROPÓSITO DE VIDA: NASCEMOS COM ELE OU CRIAMOS UM DO ZERO?
Para ler com calma.
Pense que uma circunferência de 360 graus simboliza todos os caminhos e habilidades do mundo. Agora vamos supor que a bagagem que você recebeu de fábrica tenha 90 graus dentro desses 360. Poderia ser 45 ou até 180, não importa. Você nasceu com essa quantidade de graus. Esse ângulo é o seu sentido na vida. Essa área é o seu propósito, a sua direção. Você não vai poder fugir disso. Você é escravo disso pelo resto da vida.
Logo, você nasceu com um propósito de vida e precisa descobrí-lo.
No entanto, dentro dessa direção e dessa área de contribuição, você tem liberdade total para escolher e criar um propósito específico. O grau exato dentro desse ângulo é você que escolhe. Pode mudar e pode ser mais que um. Não interessa, pois você está dentro da sua área de maior contribuição para o mundo.
Logo, você cria um propósito de vida.
Portanto, quando o assunto é propósito, nós descobrimos E TAMBÉM criamos.
Primeiro nós descobrimos quem somos, nossa personalidade, nossos talentos, nossas paixões, onde podemos contribuir da melhor maneira. Ou seja, nossa bagagem e consequentemente nossa área de contribuição.
Segundo, com base na descoberta acima, nós criamos nosso destino exato, moldamos e mudamos ele durante a vida. O importante é nunca perder o sentido.
O PODER DO AUTOCONHECIMENTO
Se a meta é descobrir quem somos e entender o tamanho do nosso pedaço de contribuição e enxergar a nossa direção, nós precisamos saber quem somos.
Se a meta é criar um propósito, é moldar uma função para desempenhar no mundo, nós precisamos saber quem somos.
Afinal, uma empresa que quer competir no mercado, precisa saber o que faz de melhor. Assim como um guerreiro que está saindo para a batalha, precisa conhecer suas armas e seus pontos fracos.
Enfim, se propósito é a meta, autoconhecimento é a base.
Você conhece algum engenheiro que sobe um prédio sem fazer a fundação?
Então, para descobrir e criar seu propósito, conheça-se bem.
CONCLUSÃO
Na prática, é claro que podemos ser qualquer coisa e é claro que podemos escolher tudo. Podemos ser tanto engenheiras e produtoras de café, quanto costureiros e advogados.
Mas a época de simplesmente sobreviver acabou. A época de fazer por fazer está chegando ao fim. A humanidade quer propósito, quer significado.
E para isso, precisamos descobrir nossa área de contribuição, nossa bagagem, nosso pedaço na circunferência de 360 graus. É com esse sentido claro que temos total liberdade para criar e moldar nosso propósito.
Qual a sua melhor maneira de contribuir para o mundo?
Referências:
Daniel Pink (2009) Drive: The surprising truth about what motivates us. Riverhead Books.
Sri Prem Baba (2016) Propósito: A coragem de ser quem somos. Editora Demócrito Dummar.
Mario Sergio Cortella (2016) Por que fazemos o que fazemos? Editora Planeta do Brasil.
Deepak Chopra (1994) The Seven Spiritual Laws of Success. Amber Allen Publishing.
Steven Pressfield (2002) The War of Art: Break through the blocks and win your inner creative battles. Black Irish Entertainment.
Helen Gagatsiu (2018) Greek Philosophy. Papasotiriou Publishing.
Murilo Gun: https://www.youtube.com/watch?v=jzGaTquma_4&list=LLbbIw3EzfPAmUFkV_fBwMog&index=4&t=0s
Abílio Diniz: https://www.youtube.com/watch?v=ahO7YMFbRbw&list=LLbbIw3EzfPAmUFkV_fBwMog&index=3&t=1s
Medium: https://medium.com/the-mission/can-you-really-be-anything-you-want-to-be-5fc6226bcdaa