Tanto modelos mentais quanto autoconhecimento eram assuntos totalmente distintos para mim até o mês passado.
Eu estudava modelos mentais, pois tenho grande interesse em tomar decisões melhores. Ponto final. E eu estudava autoconhecimento, pois quero me aproximar de uma vida autêntica. Ponto final.
Mas calma…
Se modelos mentais me ajudam a entender e interpretar melhor o mundo, será que eles também podem me ajudar a entender o meu mundo interior?
Em outras palavras, o desenvolvimento desse tema que estudo e amo (autoconhecimento) pode ser impulsionado pelo uso de modelos mentais específicos?
Fiquei feliz em descobrir que sim.
E isso é uma GRANDE notícia, pois aprender um modelo mental, não é apenas aprender uma ideia isolada, é aprender uma nova forma de pensar.
E conseguir ter formas diferentes de pensar para momentos diferentes da vida é extremamente poderoso e diferenciador.
Talvez esse seja um dos conteúdos mais relevantes que eu tenha no Blog. Que bom que você está aqui!
O que exatamente vamos ver nesse artigo?
- O GRANDE OBJETIVO
- O PODER DOS MODELOS MENTAIS PARA AUTOCONHECIMENTO
- CONSTRUINDO A SUA CAIXA DE FERRAMENTAS
- 5 MODELOS MENTAIS PARA DESENVOLVER AUTOCONHECIMENTO
- Inversão
- Antifragilidade
- Pensar Cinza
- Heurística da Disponibilidade
- Preservar o núcleo, estimular progresso
- CONCLUSÃO
Bora começar!
O GRANDE OBJETIVO
Como eu sempre falo, eu não sou psicólogo, nem coach, nem algum tipo de guru novo.
O meu objetivo não é te dizer o que fazer para viver melhor, meu objetivo não é te mostrar o “melhor caminho”. Eu acredito que não há um melhor caminho, apenas caminhos diferentes para pessoas diferentes.
Portanto, o meu grande objetivo é que você aprenda a pensar melhor. E como eu falo de autoconhecimento, eu quero que você saiba pensar melhor sobre você.
Pensando melhor, você irá se conhecer melhor e tomar decisões melhores. E não há muitas contestações de que decisões melhores significam viver melhor.
Enfim, para cumprir esse objetivo eu nunca descobri algo tão poderoso como modelos mentais, que são justamente ferramentas para nos ajudar a pensar melhor.
Eles são mapas, geralmente criados para navegarmos mais eficazmente pelo mundo exterior, mas incrivelmente úteis para explorar as nossas obscuras águas interiores.
Como exatamente?
O PODER DOS MODELOS MENTAIS PARA AUTOCONHECIMENTO
É difícil explicar o que são modelos mentais antes de mostrar exemplos, mas existem 3 analogias que eu gosto muito e que ajudam a entender:
- Modelos mentais são mapas que nos ajudam a navegar melhor pela complexidade da vida.
- Modelos mentais são lentes que nos ajudam a enxergar melhor a totalidade de uma situação.
- Outra forma é pensar que modelos mentais são ferramentas que nos ajudam a tomar decisões melhores.
Essa analogia do pessoal da Farnam Street é excelente para esse momento:
Quando um botanista vê uma floresta, ele enxerga o ecossistema. Um ambientalista vê o impacto da mudança climática. Um engenheiro florestal, o estado do crescimento das árvores. Um empresário, o valor da área. Nenhum está errado, mas ninguém conseguiu ver a totalidade da floresta.
FARNAM STREET
Ou seja, a nossa visão geralmente é incompleta. E visões diferentes são tão legítimas quanto as nossas.
Logo, ampliar seus modelos mentais é uma das melhores decisões que você pode tomar na vida, pois significa estar mais próximo de enxergar a totalidade.
Para autoconhecimento é exatamente igual. Alguns modelos mentais podem nos aproximar de enxergar a totalidade de quem somos.
Mas antes de te mostrar o primeiro, você precisa entender onde colocar os modelos que você selecionar durante a vida.
CONSTRUINDO A SUA CAIXA DE FERRAMENTAS
Na próxima seção você verá 5 modelos mentais para desenvolver autoconhecimento, mas a verdade é que existem vários por aí.
O que fazer então?
Começar a construir a sua carteira, a sua caixa de ferramentas.
Em primeiro lugar, só você saberá quais são mais úteis para você e quando. Além disso, é um trabalho da vida toda, trata-se de eternamente avaliar, eleger, testar, e manter ou substituir.
Modelos mentais passam despercebidos, disfarçados de conceitos, teorias, princípios, escondidos num livro que você comprou, num curso que você fez, ou até numa conversa interessante.
Entretanto, apenas formar a sua carteira não é suficiente para usufruir do real valor deles, você também precisa saber quais modelos aplicar e quando aplicar. E isso também é um trabalho lento e contínuo.
Para dar alguns exemplos, quando eu quero escrever sobre um assunto grande eu lembro do Princípio de Pareto. Quando eu travo em algum tipo de reflexão, eu uso a inversão (o primeiro modelo abaixo). Quando eu vejo histórias de sucesso ou leio biografias, eu tento entender se não estou sob influência do viés do sobrevivente.
Enfim, construir a sua caixa de ferramentas é importante. Da mesma forma que ter ferramentas ajuda a resolver diversos problemas da casa, modelos mentais ajudam a resolver problemas da vida.
5 MODELOS MENTAIS PARA DESENVOLVER AUTOCONHECIMENTO
Sem mais delongas, aqui estão eles: inversão, antifragilidade, pensar cinza, heurística da disponibilidade, e preservar o núcleo estimular progresso.
MODELO MENTAL 1 – INVERSÃO
O matemático alemão Carl Gustav Jakob Jacobi resolvia seus problemas mais complexos através de um conceito chamado inversão. Acontece que alguns problemas são difíceis de resolver diretamente, e olhar de trás para frente ajuda.
Enquanto, obviamente, Jacobi aplicava isso a questões matemáticas, esse modelo mental pode ser expandido para outras áreas.
Por exemplo, se uma empresa quer melhorar inovação, ela pode pensar de 2 maneiras:
- Diretamente: o que vai facilitar inovação?
- Ou inversamente: o que está dificultando inovação?
A segunda opção é boa, pois evitar estupidez é muito mais fácil do que buscar brilhantismo.
Mas a boa notícia mesmo é que esse mesmo modelo mental pode ser aplicado a nossa vida pessoal.
Quando buscamos autoconhecimento, podemos encarar algumas questões de frente: o que me faz feliz? Como ter significado na vida? Quais meus pontos fortes?
Ou podemos inverter: o que definitivamente não me faz feliz? O que não traz significado algum para a minha vida? O que eu não faço bem?
As primeiras questões são intimidadoras, geralmente dão branco e geram pouca ação. A segunda leva de questões é menos assustadora, a inversão faz nosso cérebro funcionar de outra maneira e isso pode ser mais eficiente.
Veja, o nosso inconsciente é obscuro, às vezes não é questão de não saber o que te faz feliz ou entender seus pontos fortes, é questão de se fazer uma pergunta melhor.
Numa jornada de autodescoberta é fácil travar em alguns lugares. Quando isso acontecer, experimente inverter.
MODELO MENTAL 2 – ANTIFRAGILIDADE
Em 2011, Nassim Taleb apresentou o conceito de antifragilidade. Segundo ele, existem 3 tipos de sistemas: os frágeis, os robustos, e os antifrágeis.
Enquanto um sistema frágil quebra e um sistema robusto resiste a problemas, um sistema antifrágil melhora, aprende e ganha força diante de tensão e adversidades.
Por exemplo, uma startup é antifrágil, ela busca falhar rápido, para aprender rápido, para ajustar o caminho mais rápido. Relacionamentos saudáveis são antifrágeis, diante de problemas e dores, eles ficam mais fortes, e não mais fracos.
Isso também vale para a nossa vida pessoal, precisamos ser indivíduos antifrágeis. Mas parece que as mídias sociais não estão facilitando as coisas. Essa vitrine de vida perfeita e de prazer sem fim está fazendo o oposto: construindo uma sociedade frágil, pois lá não se vê dor.
E aqui está uma grande sacada: dor é um pré-requisito para a antifragilidade. (Além, é claro, de ser um dos elementos que faz de você humano).
Logo, quando você estiver se explorando, não ignore as suas dores, tente aprender com elas e se fortalecer com elas.
O que fez meu relacionamento terminar? Como a separação dos meu pais me afetou? O que a minha demissão reflete sobre quem eu sou? Que lições eu posso tirar disso tudo?
Diferente do que o Instagram mostra, a vida não é perfeita. Uma vida composta apenas por prazeres não é uma vida feliz, é uma vida frágil e possivelmente doente.
Uma vida feliz é aquela que aprendemos e crescemos com as dores e os problemas da vida.
Portanto, na jornada de desenvolvimento pessoal, esqueça a “vida Instagram” e busque uma vida antifrágil.
MODELO MENTAL 3 – PENSAR CINZA
A sociedade vive um triste momento de pensamento preto ou branco. Ou seja, de conseguir enxergar apenas 2 lados, de raciocínios do tipo “ou você concorda com isso ou você concorda com aquilo”.
O problema é que alguns assuntos são impossíveis de serem discutidos seguindo essa lógica, por exemplo religião, política, aborto, armas, meio ambiente.
Política, no caso, é um mundo, não faz sentido nenhum enxergar apenas 2 lados.
Outro exemplo é o ser humano. Por acaso existem apenas 2 tipos de personalidade: A ou B?
Nem de perto, somos uma combinação de muitas variáveis que nos tornam únicos.
Ou seja, da mesma forma que é difícil encaixar toda a humanidade em 2 tipos de personalidade é difícil encaixar grandes temas em 2 lados, em preto ou branco.
Sendo assim, alguns temas precisam ser vistos em tons de cinza. Para alguns assuntos precisamos criar um terceiro lado.
Então quando você olhar para dentro, busque entender todos os seus tons de cinza e rejeite o raciocínio preto ou branco.
O modelo mental do pensamento cinza nos ajuda a não acreditar cegamente em um teste personalidade, em um feedback específico do seu chefe, ou em mini crenças que você mesmo criou sobre si.
Por fim, numa jornada de autoexploração, fuja das dicotomias e rejeite conclusões pretas ou brancas. Numa jornada de autoexploração, pense sempre em tons de cinza.
MODELO MENTAL 4 – HEURÍSTICA DA DISPONIBILIDADE
Foi o psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do prêmio Nobel de Economia, que falou sobre a Heurística da Disponibilidade. O que significa esse conceito? Em resumo, que a frequência de eventos pode nos influenciar.
Há um exemplo bastante claro no seu livro Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar:
“Por causa da coincidência de dois acidentes de avião no último mês, ela agora prefere tomar o trem. Isso não faz sentido. O risco não mudou quase nada. É um viés de disponibilidade”.
Daniel Kahneman
Nós temos tendência a lembrar mais do que é frequente, recente e saliente. Mas nem sempre isso é o correto. Devemos tentar evitar esse viés e buscar a verdade e os fatos.
Logo, será fácil presumir, por exemplo, que não somos bons comunicadores depois de 2 apresentações mal sucedidas na empresa. Mas será que isso representa a realidade ou será que você está influenciado pelo que acabou de acontecer?
Antes de concluir algo sobre você, investigue mais. Às vezes você já pode ter explicado algo super complexo para uma criança de 4 anos, você pode ter convencido alguém de algo delicado em uma única reunião, você pode enviar emails claros e diretos, você acalma as pessoas que você ama.
Numa jornada mais profunda de autoconhecimento, nem sempre o que é mais frequente, recente e saliente é o correto sobre você. Até por isso é fundamental estudar a nossa infância, há muitos fatos valiosos ali que sofrem o risco de serem esquecidos.
Portanto, mantenha a ideia da heurística da disponibilidade por perto para não cometer erros e para não tirar conclusões limitadas sobre você.
MODELO MENTAL 5 – PRESERVAR O NÚCLEO, ESTIMULAR PROGRESSO
Um dos meus autores favoritos de negócios é Jim Collins. Para mim, “preservar o núcleo, estimular progresso” é uma das ideias mais interessantes dele, e ela também pode ser considerada um modelo mental.
Há uma crença de que empresas têm que se transformar ao longo dos anos para manter a excelência. E isso não é mentira, mas tem um porém: não mudar o núcleo. Ou seja, seu estudo revelou que mudar é preciso, mas respeitando a essência.
Por sinal, em Como as Gigantes Caem, Collins diz que mudar demais explica melhor o fracasso do que não mudar nada.
Enfim, eu conheço várias pessoas passando por algum tipo de mudança pessoal. E de modo similar às empresas, existe uma crença de que precisamos mudar sempre para sermos bem sucedidos.
Precisamos ser mais extrovertidos, otimistas, confiantes, dominantes e por aí vai. Mas a verdade é que todo esforço de mudança é bom, desde que não rompa a sua essência.
Um jornada de autoconhecimento é isso, é entender a sua essência para entender como se encaixar melhor no mundo. Autoconhecimento não é entender a sua essência para mudá-la. Autoconhecimento é se entender e se aceitar.
Portanto, se reinventar na vida não é apenas sobre o que mudar, é também sobre o que manter. Lembre disso sempre, principalmente quando estiver num processo de transição.
Nas palavras de Collins: “preserve o núcleo, mude todo o resto”.
CONCLUSÃO
Uma coisa é aprender palavras, outra coisa é aprender contexto. Uma coisa é aprender ideias, outra é aprender ideologias. E uma coisa é enxergar a árvore, outra é enxergar a floresta.
Eu posso te apresentar ideias isoladas – e provavelmente vou também – mas o melhor que eu posso fazer por você é te ensinar maneiras de pensar.
O nosso subconsciente é muito obscuro, por isso é importante conhecermos lentes diferentes para ajudar a enxergar e interpretar o nosso interior.
A questão não é apenas se conhecer, a questão é aprender a pensar melhor sobre você.
Pensando melhor, você pode tomar decisões melhores, e indiscutivelmente decisão melhor significa vida melhor.
Referências:
Daniel Kahneman (2011) Thinking, Fast and Slow. Penguin Books. Link amazon: https://amzn.to/33T5d3g
Farnam Street (2020) Mental Models Page: https://fs.blog/mental-models/
Farnam Street (2016) The Value of Grey Thinking. Link: https://fs.blog/2016/06/value-grey-thinking/
Jim Collins (2019) Como as Gigantes Caem. Alta Books. Link amazon: https://amzn.to/3buT5bg
Jim Collins (1995) Feitas para Durar. Editora Rocco. Link amazon: https://amzn.to/2WOp7ej
Nassim Nicholas Taleb (2012) Antifragile: Things that Gain from Disorder. Link amazon: https://amzn.to/33T25ob